Mais do que uma fonte de calor e de conforto nos dias frios de inverno, as botinhas de lã que estão a ser tricotadas por voluntários da Misericórdia de Ansião irão ajudar a combater a solidão de idosos do concelho. Denominado Pezinhos de lã, o projeto pretende também afirmar-se pelo seu caráter intergeracional, envolvendo voluntários de todas as idades.

Teresa Fernandes, provedora, conta que a ideia surgiu na sequência da presença na instituição de jovens universitários envolvidos na Missão País, que aconteceu no ano passado. Entre as ações desses estudantes esteve a visita a idosos da freguesia, que pôs a nu uma das lacunas da Misericórdia: a falta de um grupo de visitas que, com regularidade, possa chegar a essas pessoas que vivem mais isoladas e que precisam de “uma palavra amiga”. É aqui que entram os “pezinhos de lã”. De que forma? A provedora explica: “Quando visitamos alguém, gostamos de levar alguma coisa. As botinhas serão um mimo que ajudarão a estabelecer esse primeiro contacto”.

Para cumprir essa missão, a Misericórdia socorreu-se, “mais uma vez”, da ajuda da comunidade. E a resposta ao desafio não podia ter sido mais positiva, com a colaboração a surgir de diversas formas. Uns oferecem a lã, outros o labor, tricotando as botas. Haverá depois quem faça sua distribuição.

Emília Ferreira e Conceição Mendes Vinagre são duas das “habilidosas”, como lhes chama a provedora, que puseram mãos à obra e que têm ajudado na confeção dos “pezinhos de lã”, pondo ao serviço dos outros uma arte que aprenderam “há anos”. As duas frequentam o CLDS (Contrato Local de Desenvolvimento Social), onde fazem trabalhos manuais, e responderam, de imediato, ao desafio da Misericórdia.

“Gosto muito de tricotar. Chego a estar até às três ou quatro da manhã de volta da lã. Não gosto de me deitar cedo e assim estou ocupada”, conta Emília Ferreira, de 75 anos, que já tricotou vários pares de botinhas de diferentes modelos. O próximo será um que viu recentemente numa montra em Ferreira do Zêzere. “Vou tentar. Não sei se consigo. Achei-o tão mimoso”, diz, enquanto dá ao dedo para avançar mais um pouco no par que tem agora em mãos.

Ao lado, Conceição Vinagre vai também desfiando lã, dando corpo a mais um par de botinhas. Recorda os tempos em que passava horas a tricotar roupas para os filhos, mas reconhece que hoje já não tem “tanta pachorra”. Mesmo assim, ainda faz camisolas, casacos e cachecóis, uma tarefa que agora colocou um pouco de lado, para se dedicar às botinhas de lã que, no próximo inverno, irão aquecer os pés e a alma de alguns idosos de Ansião. E essa, dizem Emília e Conceição, é a melhor satisfação que retiram deste seu trabalho.

Segundo a provedora, estão já confecionados cerca de 70 pares, mas a meta é chegar aos 100. A distribuição ficará a cargo de voluntários da Misericórdia, onde a direção da instituição gostaria de incluir alguns jovens. O objetivo, explica Teresa Fernandes, é que se estabeleça “um diálogo e uma ligação que possa germinar num grupo que venha a fazer visitas regulares aos beneficiários do projeto”.

“Há idosos isolados e sozinhos, a viver em grande precariedade, que a sociedade não vê. Talvez, possamos, desta forma, quebrar o isolamento e identificar necessidades, ajudando essas pessoas através da Misericórdia ou da comunidade”, acrescenta Filomena Valente, vice-provedora. A dirigente frisa que o projeto é mais uma forma de “abrir a instituição à comunidade”, uma estratégia que está também subjacente ao recém-criado grupo de voluntários, que ajudam na atividade da Misericórdia, seja colaborando no serviço de roupa, seja na cozinha ou no apoio à sala de convívio dos idosos. “Tem sido um apoio importante. Por outro lado, podemos também mostrar a mais pessoas o que se passa dentro das nossas paredes e a importância do trabalho que fazemos”, alega a vice-provedora.
 

Voz das Misericórdias, Maria Anabela Silva