Na sua maioria, os utilizadores da biblioteca itinerante são mulheres idosas, que valorizam a presença assídua desta figura, vista como confidente e amiga. Nesta interação, as “mulheres confidenciam mais, problemas de saúde, domésticos e dos filhos, enquanto os homens têm mais dificuldade em fazê-lo”. Além disso, num contexto de doença, “as mulheres aceitam melhor o diagnóstico e os homens isolam-se”.
Em termos de rotinas, tratando-se de um contexto mais rural, verifica que as “mulheres têm as suas vidas, de tomar conta dos animais, da horta e da casa”, mas tempos diminutos de lazer e descanso. Por sua vez, os homens socializam no café ou na adega após a jornada de trabalho.
Em quase duas décadas, Nuno Marçal observou também formas distintas de encarar a morte, sendo, para as mulheres que perdem os maridos ou os filhos, “uma espécie de fim de vida, em que vestem o fato do luto e bloqueiam a sua dimensão feminina”.
Em relação às preferências de leitura, as mulheres procuram “sobretudo romances, revistas de rendas, bordados e culinária”. Já os homens interessam-se, na sua maioria, por “livros técnicos de agricultura, apicultura e cogumelos ou livros de espionagem e aventura”.
Para a grande maioria dos idosos que acompanha, a ida para o lar é encarada como o “o fim”. Num curto espaço de tempo, “definham porque perdem a ligação a tudo o que eram e perdem uma coisa fundamental: a autonomia, a identidade e a individualidade”. Mas nem sempre o desfecho é assim. Noutros casos, “as pessoas renascem porque passam a ter uma alimentação equilibrada, acompanhamento médico e socialização diária”.
Neste confronto com uma “realidade dura”, o bibliotecário persiste na valorização dos idosos, como uma “fonte inesgotável de conhecimento”, apesar de a sociedade “olhar muitas vezes para eles como um fardo”.