Imagem. “Fotografo três vezes mais mulheres do que homens nos lares”, revela Sandra Ventura, que se dedica, desde 2013, a retratar idosos. A prevalência de mulheres é explicada pela maior esperança de vida, mas não traduz, necessariamente, melhor qualidade de vida. “Vivem mais tempo, mas também vivem mais sobrecarregadas. E obviamente tiveram uma vida muito mais atarefada do que os homens, no campo, com os filhos e em casa”, alerta.

Na visita aos lares, nota que a relação das mulheres com o corpo e a imagem também difere dos homens. “Lidam pior com o espelho e com fotografia. Queixam-se mais e têm complexos com as rugas. Envelhecer não é uma coisa que as anime propriamente”.

Durante os preparativos que antecedem as sessões, assiste a uma “transformação” diante do espelho. Na generalidade das retratadas, os cuidados de beleza já não fazem parte das rotinas diárias, embora, na sua opinião, sejam “tão importantes como a comida e roupa lavada”.

A fotografia, enquanto testemunho da passagem do tempo, permite um confronto com a identidade, num tempo que nem sempre reconhecem como seu. “Algumas pessoas olham-se pela primeira vez e percebem que têm rugas, mas há também quem goste do que vê e se sinta bonita”. Um episódio que a marcou, a este nível, foi o de uma pessoa com demência que “olhou para a sua imagem e viu a avó porque estava mais velha do que na ideia dela”.

Para Sandra Ventura, todas as fases da vida merecem ser registadas. “Não é toda a gente que tem o privilégio de chegar à velhice e, portanto, temos de fotografar, seja com rugas ou cabelos brancos”. Mas deixa um alerta: “Não vou com a ideia de fazer a última fotografa para a campa, mas sim de emoldurar para colocar no móvel de casa. Já pensou na quantidade de fotografias de velhos que estão em molduras?”. Certamente inferiores às das crianças, cujas fotografias todos compram, quando faz as mesmas sessões nos jardins de infância. “Porque as pessoas não ligam aos velhos, a velhice é chata”, lamenta.

Ana Cargaleiro de Freitas, Voz das Misericórdias