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- Pernes | ‘A idade é apenas tempo e o tempo somos nós que o inventamos’
A sessão de abertura esteve a cargo do provedor Manuel João Maia Frazão, que sublinhou o “orgulho” da instituição em celebrar o Dia Internacional do Idoso “num ambiente de proximidade e de partilha com a comunidade”.
“Envelhecer não é uma tristeza, é uma vitória. O difícil é, por vezes, viver com qualidade. Cuidar dos idosos é cuidar do futuro das comunidades”, afirmou, agradecendo o envolvimento das IPSS e Misericórdias do distrito, das juntas de freguesia, autarcas, forças de segurança e técnicos.
Seguiu-se a intervenção de Manuel de Lemos, presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), que alertou para a necessidade de respostas integradas para fazer face aos desafios do envelhecimento. “Precisamos de garantir qualidade de vida, atividade saudável e respeito pela dignidade humana. E as Misericórdias articulam e abrangem, precisamente, a dimensão social e a dimensão de saúde”, afirmou.
O primeiro painel da conferência contou com o médico António Pinto Correia, que traçou um retrato da realidade portuguesa nas últimas décadas, deixando, no fim, um apelo: “Somos um país que reage muito e previne pouco. Está na hora de planearmos o futuro, porque vamos ter cada vez mais idosos e as famílias não terão condições para prestar cuidados sozinhas”. Seguiu-se Manuel Pelino, bispo emérito de Santarém, que trouxe à conferência uma reflexão de natureza espiritual e humanista sobre o envelhecimento. “A sabedoria de um povo mede-se pela forma como cuida dos seus mais velhos”, referiu.
Na intervenção final de síntese, Manuel de Lemos, que moderou o painel, destacou o papel das Misericórdias e IPSS no apoio a idosos e sublinhou as dificuldades de sustentabilidade financeira, explicando que o Estado comparticipa apenas cerca de 37% do custo real por utente, quando o valor de referência deveria atingir 50 a 60%. “O custo médio mensal de um idoso em lar ronda os 1600 euros e o Estado comparticipa cerca de 660. O restante é assegurado por reformas muitas vezes insuficientes e por famílias sem capacidade económica. Esta realidade explica o recurso crescente a lares que operam fora do sistema”, alertou. O segundo painel, moderado pelo apresentador de televisão José Figueiras, trouxe à conversa o jornalista Fernando Correia e o escritor Pedro Chagas Freitas, que partilharam testemunhos de vida e reflexões sobre a fragilidade da condição humana. José Figueiras abriu a sessão com uma partilha pessoal sobre o percurso da mãe, atualmente com 90 anos, que, após uma queda, passou a residir num lar da Misericórdia da Amadora. O comunicador elogiou o trabalho das instituições sociais, sublinhando que “as Misericórdias e IPSS são verdadeiras casas, onde há convivência, dignidade e afeto”. Com 90 anos, Fernando Correia trouxe ao debate uma mensagem de esperança e humor, afirmando que “envelhecer é uma honra e um privilégio”. “Se eu acreditasse na idade que tenho, não estava aqui. A idade é apenas tempo e o tempo somos nós que o inventamos”. Recordou ainda a mãe dos seus filhos, com Alzheimer, a quem dedicou vários livros, escritos “à cabeceira, quando já não reconhecia ninguém”. “Ela está fora do tempo. A memória dela, que é tempo, não existe. Está num sítio onde eu um dia hei de chegar para lhe agradecer os filhos que me deu”, partilhou, emocionado. O escritor Pedro Chagas Freitas, autor de obras como ‘Prometo Falhar’ e ‘Hospital de Alfaces’, explorou a noção de felicidade e fragilidade humana, contrapondo a euforia da juventude à serenidade da maturidade. “A vida é frágil como uma folha de alface e é essa consciência da fragilidade que nos torna humanos”, disse o escritor. Relatando dois momentos que o transformaram - a perda do pai e o internamento prolongado do filho - sublinhou o papel da alegria como forma de resistência: “O contrário de rir não é chorar. É não rir. O riso e a lágrima são irmãos gémeos. A alegria salvou-nos”, concluiu.
Voz das Misericórdias, Filipe Mendes