Nos 520 anos da Misericórdia de Coimbra, a resposta das Santas Casas à pandemia de Covid-19 foi um dos temas principais

A sessão solene comemorativa da data da carta real dirigida, em 12 de setembro de 1500, aos “homens bons de Coimbra”, concedendo-lhes, por alvará, “todos os privilégios outorgados à Misericórdia de Lisboa”, e que então legitimava oficialmente a fundação da Misericórdia de Coimbra, serviu para evidenciar o rosto da solidariedade para com os mais pobres e desfavorecidos, merecendo elogios por parte do governo. Festejar 520 anos em época de pandemia e sem nenhum caso de Covid-19 até ao momento é um motivo de confiança para continuar a dar a mão a quem mais precisa nos tempos difíceis.

Na tarde quente de sábado, aproveitando a sombra dos claustros do antigo Colégio de Santo Agostinho (ou Colégio da Sapiência), a ministra da Coesão Territorial declarou que a Misericórdia de Coimbra “tem pergaminhos” e que continuará “a fazer história”. “As Misericórdias podem ter mais de 500 anos, mas o seu papel nunca foi tão atual nem tão importante”, sublinhou Ana Abrunhosa.

Admitindo que “não precisamos de recursos muito avultados para fazer coisas extraordinárias”, a governante, que presidiu à sessão solene, destacou que nesta “crise inédita que vivemos, as Misericórdias estiveram mais uma vez na linha da frente”.

“Quando o país foi obrigado a parar, as Misericórdias continuaram a sua missão. Na fase dos desconfinamento tiveram a coragem de avançar”, disse a ministra, recordando, ao mesmo tempo, que “só conseguimos enfrentar essa pandemia se trabalharmos em rede, sem partidos, nem individualismos, para um único objetivo que é apoiar os mais frágeis e é esse o exemplo que as Misericórdias nos dão”.

“Não podemos esquecer que fomos assaltados por um vírus que mudou a nossa vida e os desafios das Misericórdias não são apenas os desta crise.” Destacando que “instituições que vivem para as sociedades absorvem os problemas dessas sociedades”, Ana Abrunhosa chamou a atenção para o “envelhecimento da população” e “exigência de novas respostas sociais, cada vez mais inovadoras", capazes também de “contrariar ciclos económicos negativos que fazem alastrar pobreza e exclusão social, falindo famílias e instituições. A todos esses problemas e desafios, a resposta das Misericórdias tem sido extraordinária e sempre na linha da frente do empreendedorismo social”.

Na sua intervenção, Ana Abrunhosa – que ali foi anunciada pelo provedor, José Manuel de Sousa Vieira, como “nova irmã da Santa Casa de Coimbra” – confirmou a “exemplar obra social” que a Misericórdia desenvolve na região, a mais de 350 pessoas das diversas faixas etárias, através da creche e do lar de infância e juventude, bem como da casa de acolhimento ou dos apartamentos de autonomização que a governante teve oportunidade de visitar, relevando a sua importância para “assegurar a transição dos jovens que deixam a fase de institucionalização”, a par das residências para estudantes universitários e dos centros de apoio à terceira idade, além do apoio domiciliário, entre outras.

Ao tomar a palavra, na sequência do presidente da Mesa da Assembleia Geral, Henrique Vilaça Ramos (que iniciou a sessão solene comemorativa do 520.º aniversário e do 20.º da abertura do Museu da Santa Casa, com o número de pessoas condicionado pelas normas da Direção-Geral da Saúde), o provedor José Vieira identificou as necessidades registadas pela sua equipa diretiva. Assim, este dirigente deu conta, sobretudo ao governo, das obras de requalificação no Centro de Apoio à Terceira Idade (CATI) de S. Martinho do Bispo e do reforço na prevenção da Covid-19, atendendo à realização de uma nova fase de testes de despistagem precoce de infeções, bem como da aquisição de mais equipamento de proteção individual.

Antecipando a assinatura do contrato de parceria com a Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos), o provedor da Misericórdia de Coimbra falou da abertura de linhas de financiamento no alcance do Programa de Alargamento da Rede de Equipamentos Sociais (PARES) para avançar na construção do novo Centro Sagrado Coração de Jesus (nas instalações do antigo seminário, em Montes Claros), a fim de responder a mais de 200 utentes (com valências de creche, jardim de infância e estrutura residencial para pessoas idosas), o que envolverá a criação de quatro dezenas de postos de trabalho e um investimento que ascende a 3,5 milhões de euros.

Na mesma sessão, as académicas e historiadoras Maria Antónia Lopes e Maria José Azevedo Santos divulgaram a intenção de coordenarem dois projetos editoriais da Misericórdia de Coimbra: o “Livro dos Benfeitores”, numa edição integral e fac-similada do catálogo de benfeitores desta Santa Casa; e a concretização de um trabalho monográfico, em dois volumes, com cerca de 450 páginas cada um, em que uma equipa de 10 jovens investigadores escreverá a história da instituição.

Logo a seguir à intervenção de João Bento, presidente dos CTT, na oportunidade do lançamento do inteiro postal comemorativo do 520.º aniversário desta irmandade conimbricense, o presidente da União das Misericórdias Portuguesas (UMP), atendendo também à necessidade de preservar a memória para construir o futuro, elogiou o trabalho de todas as “mesas” da Misericórdia de Coimbra que, desde o reinado de D. Manuel I, souberam cumprir o legado que têm recebido, incluindo os muitos colaboradores “absolutamente determinantes para tudo o que temos de fazer”. Manuel de Lemos não quis assumir a celebração de um momento festivo sem “trazer uma prenda”, oferecendo “em nome de todas as Misericórdias”, uma imagem de Nossa Senhora da Misericórdia, executada em barro pelas irmãs Flores, de Estremoz.

Por sua vez, a secretária de Estado da Ação Social disse querer aproveitar a ocasião para conhecer mais e melhor os projetos que a Misericórdia de Coimbra “pretende desenvolver no âmbito da sua intervenção social, alargando o apoio social a mais idosos, crianças e jovens, e a mais pessoas vulneráveis da comunidade”. Daí que, para Rita da Cunha Mendes, seja importante “reconhecer e celebrar o passado”, avivando a memória desta instituição e, ao mesmo tempo, “compreender a responsabilidade social da sua herança para o futuro”.

“As Misericórdias portuguesas com mais de 500 anos de história são instituições detentoras de uma larga experiência acumulada a favor de todos aqueles que mais precisam e, por isso, são parceiros privilegiados do Estado no cumprimento da sua missão de apoio, em especial aos cidadãos mais vulneráveis”, observou Rita Mendes, agradecendo publicamente, em nome do governo, ao presidente da UMP, por, “com muita lealdade, expressar as preocupações e as inquietações das Misericórdias por si representadas”. Como confirma a governante, Manuel de Lemos, “com a sua experiência e capacidade de concertação, tem ajudado o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, em cada momento e através de reuniões mensais, a encontrarmos as melhores respostas que consideramos para salvaguardar a proteção das pessoas, mitigar a doença e os seus efeitos junto das instituições”.

Voz das Misericórdias, Vitalino José Santos