Se quisermos usar uma linguagem própria de arquivo, podemos dizer que no Arquivo e Centro de Documentação da Santa Casa da Misericórdia de Gaia estão 21 metros lineares de livros e outras publicações. Ou seja, na soma de todas as estantes preenchidas, do A ao Z, encontram-se largas centenas de documentos. Não apenas livros, mas também registos, plantas, assentos e um sem fim de publicações. Estes 21 metros lineares não contabilizam, à data, muita documentação que ainda aguarda por avaliação, catalogação e, ainda, higienização.

Páginas e páginas que encontram nas mãos de Catarina Nogueira e Paula Costa a atenção que merecem. O Voz das Misericórdias (VM) foi conhecer parte do trabalho desenvolvido. “Inventariar, selecionar, avaliar, descrever, organizar, controlar a informação, digitalizar, inserir na plataforma digital interna”. Estes são apenas alguns dos passos que Catarina Nogueira – responsável pelo Arquivo e Centro de Documentação – realiza, auxiliada por Paula Costa. O espaço foi fundado em 2013, mas efetivamente, apenas nos dois últimos anos foi possível uma organização mais rigorosa. “Foram dois anos muito produtivos e de muita evolução”, conta Catarina Nogueira.

Paula Costa acrescenta, a sorrir, que “há quem fale de arquivo morto, mas de morto não tem nada. Está aqui uma parte da história do concelho. E preservar isso é muito bom”.

Neste espaço estão reunidos fundos documentais dos principais beneméritos da instituição, com destaque para Salvador Brandão (fundo com maior documentação). No mesmo local, está também reunida informação de todos os departamentos e valências da Santa Casa da Misericórdia de Gaia.

“Com a organização que implementámos, conseguimos, num curto espaço de tempo, responder a uma solicitação por parte de qualquer serviço. Sejam documentos relacionados com recursos humanos, património ou até faturas antigas”, explicam as funcionárias adstritas ao Centro de Documentação.

Reunir publicações para participação em exposições, como aconteceu por ocasião do aniversário do Lar Almeida da Costa, tornou-se, também, uma tarefa facilitada. “Conseguimos reunir boas memórias e relíquias de documentação”, revelam. A delicadeza de alguns exemplares obriga a um manuseamento muito particular. “Temos documentos sensíveis que não permitem deslocações fora do espaço. O que fazemos, acima de tudo, é conservar, fazer o trabalho de descrição dos fundos seguindo normas arquivísticas, higienização dos livros documentais para dar continuidade ao bom estado dos mesmos e divulgação interna”, explicam.

Em algumas situações, é necessário também proceder a pequenos restauros. “É a parte mais gira”, assumem com entusiasmo. Desde o restauro de pequenos rasgões com fita cola livre de ácidos, à limpeza com trinchas adequadas e ao tratamento de alguns fungos, o fundamental é preservar.

Catarina Nogueira, licenciada em Gestão de Património, com mestrado em História do Património ligado a Estudos Locais e Regionais, passou pelo Arquivo Distrital do Porto, antes de chegar à Misericórdia de Gaia. Dois anos volvidos, não hesita em afirmar que “manter o espaço cuidado e visível é uma preocupação da Misericórdia e uma aposta na preservação do património”.

Apesar de serem escassas as formações especializadas na área, abraçam “com o apoio da instituição” todas as que possam contribuir para enriquecimento e crescimento. Recentemente, e num curto espaço de tempo, têm surgido convites para apresentação do equipamento, como por exemplo, no Dia do Património das Misericórdias, realizado em Viana do Castelo.

“Acredito que há ainda muita gente que não sabe que existimos. É muito importante esta fase de divulgação e de partilha de experiências”, admitem.

A abertura do Arquivo e Centro de Documentação da Santa Casa da Misericórdia de Gaia ao público é uma intenção futura.

No entanto, atualmente, é possível, mediante autorização superior, que estudantes e investigadores possam consultar alguns documentos ali depositados. “Sempre com supervisão, pois lidamos com exemplares muito antigos e sensíveis”, avisam. Também um espaço de biblioteca poderá ali nascer numa outra fase de funcionamento. Hoje, sentem que, fruto da organização implementada, o espaço regista uma “evolução tremenda”. “Para nós é gratificante e empolgante”, concluem.

 

DOCUMENTOS MAIS CURIOSOS

Entre todos os documentos, perguntamos quais suscitaram mais curiosidade a Catarina e Paula. De forma quase unânime, evidenciaram os documentos da área hospitalar. “Encontrámos descrita, ao pormenor, a doença que a pessoa tinha, as manifestações da mesma, uma descrição muito detalhada e rigorosa”. Há ainda o registo das doenças da época, de situações atmosféricas como tornados e respetivo registo do número de mortes e outros factos relacionados. Na documentação afeta aos serviços, encontram-se livros de inscrição de crianças, de utentes do asilo e até registo de óbitos.

 

Voz das Misericórdias, Vera Campos