Em ano de centenário da Misericórdia, a decisão de levar a cabo, pela primeira vez, este apoio a peregrinos está a superar todas as expectativas.

Corpos cansados. Rostos iluminados pela fé. Caminham há 8 horas quando chegam ao ponto de apoio a peregrinos da Santa Casa da Misericórdia de Ílhavo. O caminho, que é de peregrinação, começou pelas duas da manhã. Hoje, dia 8 de maio, deixaram as suas casas nos concelhos de Ovar e Santa Maria da Feira e seguem rumo a Fátima. Ao todo são 28. Homens e mulheres com idades entre os 30 e os 70 anos. Por fé e pela fé, cumprindo promessas ou, simplesmente, em agradecimento à Nossa Senhora de Fátima pela vida.

Os últimos 30 quilómetros foram percorridos a pé. Uma caminhada feita debaixo de chuva, vento e frio. Passam poucos minutos das 10 da manhã quando são, calorosamente, recebidos pela equipa que está de serviço no apoio a peregrinos da Santa Casa da Misericórdia de Ílhavo.

Localizado nos jardins da unidade de cuidados continuados integrados (UCCI), o apoio é prestado ao nível físico e emocional.  Cumprindo a obra de misericórdia “dar apoio aos peregrinos”, a provedora da Santa Casa de Ílhavo, Margarida São Marcos, conta ao VM que os últimos dias têm sido “extraordinários”. Em ano de centenário, a decisão de levar a cabo, pela primeira vez, este apoio a peregrinos está a superar todas as expectativas.

“Mesmo não sendo um caminho principal de passagem de peregrinos para Fátima, estamos extremamente felizes pelo apoio que temos prestado. Temos toda uma equipa motivada e disponível a colaborar. É muito gratificante ver a interação entre colaboradores das diferentes valências da instituição em prol do outro”.

Amália, Vera e Manuela são todas colaboradoras da Santa Casa e nunca tinham convivido umas com as outras de forma tão intensa. Nos últimos dias puderam conhecer-se e reforçar laços de amizade. “Estamos nas nossas valências, nos nossos trabalhos, e por vezes nem sequer nos cruzamos. Esta decisão, para além de muito importante para os peregrinos, é também muito gratificante para a relação entre colegas da mesma instituição”.

A conversa é interrompida. Os peregrinos que acabam de chegar vêm cansados. É preciso colocar em ação tudo aquilo que está preparado. Há bebidas quentes, pão, fruta, água e bolachas. Mantas estendidas para que se possam deitar. Meias para trocar. Enfermeiros e auxiliares que, de forma imediata, identificam as queixas apresentadas e aplicam massagens terapêuticas. Tratam-se algumas bolhas e trocam-se conselhos a ter em conta para os próximos quilómetros. O conforto emocional e a palavra de confiança são o denominador comum de todos os diálogos.

Aproveitamos para conhecer um pouco quem acaba de chegar. O cansaço impede longos discursos. José Guimarães, de Santa Maria da Feira, é veterano nestas andanças. Há mais de vinte anos que faz, por ocasião do 13 de maio, esta peregrinação a Fátima. Este ano foi, positivamente surpreendido pelo posto de apoio da Misericórdia de Ílhavo. “Muito, mesmo muito importante. Fundamental era que existissem outros semelhantes ao longo do percurso.”

Este grupo prevê chegar a Fátima três dias depois, no sábado, dia 11 de maio. Em Ílhavo, alguns confessam-nos atravessar dificuldades. Rosa (nome fictício) vem de Avanca. As dores musculares que sente, nesta altura, fazem-na desanimar. “Só conseguirei se a Nossa Senhora fizer um milagre”. Durante alguns anos fez esta peregrinação, mas interrompeu para retomar agora em 2019. Para além do cansaço, pesam as saudades. “As saudades da família são difíceis de ultrapassar ao longo do percurso, mas o telemóvel é aqui um aliado de peso. Esta paragem na Santa Casa foi uma maravilha”, revela antes de recomeçar.

Para apoiar esta “Rosa” e tantas outras, há quem faça a peregrinação, não apenas para cumprimento de promessas, mas como voluntário. Fernando e José fazem o caminho de Fátima há mais de uma década. Numa fase inicial para cumprir promessa, agora mais para agradecer e para ajudar. “Como voluntários e com a experiência que já adquirimos, conseguimos ajudar peregrinos que apresentam maiores dificuldades”.

Estes peregrinos realçam que a parte psicológica é mais importante que a física. “Por mais debilitados que possam ir, se a mente ajudar o objetivo será alcançado”. Ao longo deste tempo só por uma vez não conseguiram convencer um peregrino a seguir em frente.

O enfermeiro Leandro Oliveira é da mesma opinião. Apesar de também trabalhar na Cruz Vermelha esta é a primeira vez que está a prestar apoio a peregrinos. “A tarefa é muito enriquecedora. Aqui, além de minimizarmos o sacrifício físico, curando bolhas e massajando pernas, temos um contributo importante na vertente psicológica. Temos sempre uma palavra de conforto e de ânimo que assume grande relevância, incentivando aqueles que estão mais desanimados”.

O apoio aos peregrinos prestado pela Misericórdia de Ílhavo esteve no terreno entre 2 e 10 de maio das 8 às 18 horas. No próximo ano a ideia pode passar por alargar o horário e assim apoiar quem faz o percurso durante a noite. Voz das Misericórdias, Vera Campos