Única no país, a história da ‘Procissão dos Homens’ remonta a 1581, altura em que foi criada a Misericórdia do Ladeiro. É nesta ligação afetiva com a população que reside o segredo desta longevidade

Pequena na dimensão e na atividade, que se circunscreve aos 40 dias da Quaresma, a Santa Casa da Misericórdia do Ladoeiro é, no entanto, grande no propósito: manter vivas as tradições e as manifestações de fé deste período, em particular, uma procissão que é única no país e que existe “desde a primeira hora”, quando foi criada a Santa Casa, há 444 anos.

A ‘Procissão dos Homens’ realiza-se cinco vezes durante a Quaresma, sempre às sextas-feiras, a partir das 20h30, e nela só participam homens, para manter a secular tradição. “Uma manifestação de fé para que o que a terra nos dá garanta o futuro para a comunidade”, já que a aldeia “sempre foi essencialmente agrícola e tem muito a ver com isso, para que haja sempre fruto”, explica Pedro Ribeiro, o novo provedor da Misericórdia do Ladoeiro, que tem na Quaresma e nas suas manifestações religiosas a razão principal da sua existência.

“Embora estejam previstas, no Compromisso, atividades de cariz social ou cultural nunca teve atividades sociais, sempre teve, desde a primeira hora, e organiza a ‘Procissão dos Homens’ que se manteve ao longo destes séculos.”

A procissão tem início na capela da Misericórdia, de onde saem os irmãos vestidos de opas pretas, acompanhados pela cruz de Cristo, pelo pároco e pela população masculina. Percorrem as principais artérias da freguesia até igreja, onde os espera os membros da Confraria do Santíssimo Sacramento do Ladoeiro, vestidos de opas vermelhas.

“Durante a procissão canta-se a Ave Maria, a Santa Maria e o Pai Nosso, em andamento, e quando estão ajoelhados cantam a Glória. Na igreja é rezado o mistério alusivo à crucificação do Senhor e depois partimos de regresso à capela, passando pelas ruas principais, sempre a cantar.” Os cânticos são os únicos sons que se ouvem na noite e as velas a luz que acompanha a ‘Procissão dos Homens’, sempre muito participada. “Temos 30 irmãos a participar, 20 a 25 confrades e há sempre 30 ou 40 homens da população que acompanham a procissão”. Na última procissão, na sexta-feira antes da sexta-feira santa, é celebrada, no final, uma missa pela alma dos irmãos já falecidos.

A Misericórdia do Ladoeiro tem 75 irmãos, desde os três anos até aos 80, um número que assegura o futuro porque “é uma imagem muito bonita, as pessoas mais velhas já começam a levar os netos, fizeram os netos como irmãos da Misericórdia, passam-lhe a causa e acho que esta procissão vai estar garantida por muitos anos”, conta Pedro Ribeiro.

É nesta ligação afetiva que reside o segredo da longevidade da Misericórdia do Ladoeiro, uma ligação que levou o atual provedor a avançar, nas eleições que se realizaram a 18 de março de 2024.

“Há uma ligação sentimental a essa Irmandade, o meu pai foi provedor desta Misericórdia e eu, desde pequeno, que participo nestas iniciativas. Sempre abracei esta causa e agora chegou a altura de prestar mais um pouco da minha colaboração a esta Irmandade.”

A grande atividade é esta procissão secular e única. “Não temos conhecimento que se realize outra no país, esta Mesa Administrativa tomou posse há um ano e cabe-nos a nós zelar e dinamizar esta procissão e dar-lhe a ênfase que ela merece.”

A Santa Casa do Ladoeiro é ainda responsável pela organização da ‘Procissão dos Passos’, pela ‘Procissão do Encontro’ e pela ‘Procissão do Enterro do Senhor’, na sexta-feira santa. Terminada a Quaresma, a Misericórdia não tem atividade, a não ser preservar a capela, “que serve de casa mortuária da aldeia”, e o seu património religioso, para que, no ano seguinte, possa manter vivas estas seculares tradições, tão antigas quanto a própria instituição. 

Voz das Misericórdias, Paula Brito Batista