A exposição fotográfica da Misericórdia de Santo Tirso visa sensibilizar a comunidade para as fragilidades das vítimas de violência

As dores nas mãos podem ser causadas por diversos fatores. Todas as patologias podem ser tratadas, promovendo o alívio físico. Mas as mãos podem também expressar sentimentos mais dolorosos e profundos: dor na alma. “Há quem fale pelas mãos”, assegura Ana Alvarenga, jurista da Casa Abrigo D. Maria Magalhães, da Santa Casa da Misericórdia de Santo Tirso, e fotógrafa nas horas livres.

De objetiva na mão, Ana Alvarenga captou as mãos de 12 mulheres vítimas de violência doméstica. São as "Marias sem Medo" e estão patentes ao público, em exposição, até 31 de outubro, na Estação da Casa da Música do Metro do Porto. Esta mostra integra o programa da EAPN Portugal, no âmbito da Semana pelo Combate à Pobreza e Exclusão Social. “As utentes, mostraram-se sempre muito disponíveis perante a câmara, estando muito recetivas a contar a história daquela maneira. Foi fácil transmitir aqueles trajetos de superação através das mãos”, conta a fotógrafa.

São “Marias sem Medo” pela coragem de assumir a denúncia de procurarem uma vida diferente e abraçarem esta mudança que acontece nas suas vidas. “São Marias com menos medo”, de vários estratos sociais, embora as que chegam à Casa Abrigo, apresentem, por norma, “maior fragilidade económica”, revela ao Voz das Misericórdias (VM), Maria João Fernandes, psicóloga e coordenadora desta resposta social.  

A morosidade da justiça é um travão à reintegração destas mulheres na sociedade. “São as vítimas que são afastadas das suas casas, perdem os empregos, a família, enquanto o processo se arrasta sem penalização do agressor”, lamenta Maria João Fernandes.

Durante o período em que são acolhidas pela instituição (de seis meses a um ano), as vítimas recebem um apoio fundamental de uma equipa multidisciplinar, com intervenção em várias áreas, nomeadamente nas vertentes social e psicológica. 

Arranjar uma solução habitacional é a maior dificuldade no processo de autonomização, apesar das parcerias dos municípios com a comissão para a igualdade do género. “Não existe habitação social disponível e esta circunstância, muitas vezes, provoca o prolongamento da institucionalização, tornando o processo ainda mais penoso”, explica a coordenadora da Casa Abrigo.

Apesar de se notarem alguns esforços da sociedade para apoiar as vítimas de violência doméstica, há ainda um longo caminho a percorrer. “As vítimas são ainda olhadas com preconceito, excluídas mesmo, por as considerarem, erradamente, desorganizadas, com doenças mentais, dificuldades na relação com o trabalho e com os filhos, carregando um estigma muito pesado. Na generalidade, as pessoas quando se apercebem que estas mulheres vêm da Casa Abrigo, fecham as portas a arrendar uma casa ou a uma entrevista de emprego”, lamenta.

Por isso, esta exposição tem por objetivo passar uma mensagem positiva, mostrando que, com a ajuda da Casa Abrigo e a determinação destas e de outras Marias, “é possível contornar o caminho”, assegura Ana Alvarenga.

Voz das Misericórdias, Paulo Sérgio Gonçalves‌