“Olhai que o carro da saúde vem aqui a Limãos”. É assim que Piedade Neto, habitualmente, avisa a população desta pequena aldeia do concelho de Macedo de Cavaleiros sobre a visita da unidade móvel de saúde da Santa Casa da Misericórdia.

Uma vez por mês, os moradores já sabem que têm os cuidados de saúde à porta de casa. Medir a tensão e a glicémia, ouvir conselhos ou até mesmo tirar dúvidas são apenas algumas vantagens da carrinha que leva saúde às localidades deste concelho, muitas com apenas algumas dezenas de pessoas, quase todas já idosas.

De Limãos à cidade de Macedo de Cavaleiros são apenas 12 quilómetros de distância e nos dias de hoje parece até irrealista que um percurso tão pequeno se torne num verdadeiro obstáculo. Isto porque há muitos idosos que não têm carro ou nem têm carta de condução e, para se deslocarem, recorrem a meios de transportes públicos ou pagam a um táxi, que representa um custo de “26 euros ir e vir”, “muito caro” para quem tem reformas pequenas.

É para colmatar este problema e suprimir necessidades que a Santa da Misericórdia de Macedo de Cavaleiros, em parceria com o município, tem uma unidade móvel. Se as pessoas não podem ir até aos cuidados de saúde, os cuidados de saúde vêm até si.

Lurdes Silva tem 80 anos e “quase sempre” aproveita a visita da enfermeira Cristiana para perceber “como vai o estado de saúde”, com a medição dos “diabetes e do colesterol”. Não tem dúvidas de que este serviço é uma mais-valia para quem ali mora. “É importante virem cá, ficamos mais sossegados”, realçou a idosa que vive sozinha e que não tem carta de condução para se poder deslocar.

Eram nove da manhã e já vários idosos aguardavam o regresso da unidade móvel. Alguns chegaram mesmo a deixar as hortas porque não queriam perder a oportunidade de ser vistos por um profissional de saúde.

No caso de Alípio Lago, a situação é diferente. Com 66 anos é emigrante. Já reformado, passa alguns meses do ano em França e os restantes na aldeia que o viu nascer. Conhece bem a realidade de outros países, onde ao pé de casa existe um centro de saúde e as acessibilidades são outras. Defende que em Portugal os cuidados podiam ser os mesmos, com unidades de saúde nas localidades mais pequenas, mas já que assim não é, reconhece que a unidade móvel é “uma coisa boa” para “as pessoas da aldeia”, que estão “mais seguras”.

Já com alguns problemas de saúde e uma vez que agora está na aldeia, também aprovei leva e traz todos os dias, já que ela não tem carta de condução. O autocarro até podia ser uma solução, se o ano letivo escolar não tivesse terminado e com ele também não tivesse acabado este meio de transporte. “Acaba a escola, acaba o autocarro”, lamentou. E é por esta e por outras que admitiu sentir-se “isolada”.

A unidade móvel de saúde da Misericórdia de Macedo de Cavaleiros já existe há vários anos, sendo que há nove é a enfermeira Cristiana Brás a coordenadora do projeto e também quem visita as aldeias.

O serviço, por vezes, serve apenas um utente, como acontece em Carrapatinha, mas é o suficiente para que esta localidade não fique esquecida. Em alguns casos, as visitas são feitas rapidamente, por haver pouca população, noutros é a distância à sede de concelho que se torna um constrangimento. Por exemplo, em Nozelos, cerca de dez pessoas usufruem da unidade móvel, mas estão bastante isoladas.

É por isto que um serviço de saúde deixa de ser apenas um serviço de saúde e se torna, para muitos, num “combate à solidão”. É dentro da carrinha que os idosos aproveitam para desabafar sobre os seus problemas, pedir conselhos, fazer questões de saúde ou até mesmo dar apenas dois dedos de conversa.

“Alguns deles já conheço a família quase toda. Já conheço os problemas de saúde. No interior, a população é maioritariamente envelhecida, muitos deles estão sozinhos e acabam por encontrar aqui algum conforto. Por eles vínhamos todas as semanas”, confessou Cristiana Brás.

A profissional da Misericórdia tem vindo a criar um laço de proximidade e de confiança com estas pessoas, que, não raras vezes, a convidam para “beber um café” em sua casa. E é nesse momento que percebe o quão “gratificante” é fazer parte da vida delas. “Uma senhora que, na altura da pandemia de Covid, depois de termos estado parados, quando voltámos a circular disse-me que já andava a sonhar comigo. Isso também nos preenche o coração, torna-se muito gratificante ouvirmos estas palavras, de que já estavam a sentir a nossa falta”, recordou com um sorriso.

De acordo com o provedor da Santa Casa da Misericórdia de Macedo de Cavaleiros, António José Vaz, a área social é um dos “princípios e objetivos” da instituição, que é cumprido através, mas não só, da unidade móvel, “um serviço público importante para a comunidade”, uma vez que desenvolve um “trabalho de proximidade”. “Estarmos presentes junto das pessoas, daquelas que estão mais longe, com cuidados de rastreio e que são fundamentais. O simples facto de estarmos lá, falarmos com as pessoas, termos uma escuta ativa para com a nossa comunidade” torna importante este trabalho, frisou.

Além da enfermeira Cristiana Brás, a Santa Casa da Misericórdia de Macedo de Cavaleiros tem nos planos aumentar a equipa da unidade móvel com um psicólogo e um profissional na área da animação, referiu o provedor António José Vaz.

Voz das Misericórdias, Ângela Pais