Envelhecimento vai obrigar a uma maior articulação entre os cuidados sociais e de saúde.

Mais idosos, doenças crónicas, diagnósticos de demência e doenças mentais vão provocar maior sobrecarga nos cuidadores e exigir maior articulação entre os cuidados sociais e de saúde. Perante este cenário, corroborado pelas estimativas do INE (32% da população será idosa em 2060), a União das Misericórdias Portuguesas apresentou um modelo global de cuidados que integra o serviço prestado pelas equipas de apoio domiciliário e saúde. Estes e outros resultados foram alvo de debate num seminário realizado em Fátima, no dia 7 de maio.

Coordenado pela UMP, o grupo de trabalho constituído pelas Misericórdias de Vila Verde e Cantanhede, investigadores do CINTESIS – Centro de Investigação em Tecnologias e Serviços de Saúde e Instituto Pedro Nunes uniu esforços para apoiar as Misericórdias na identificação de necessidades não cobertas pelo serviço de apoio domiciliário (SAD), implementação de serviços diferenciados e criação de redes de parceria com entidades de saúde locais.

A mudança de paradigma, defendida por técnicos e especialistas na área do envelhecimento, privilegia uma intervenção de proximidade, focada nas necessidades dos utentes e cuidadores, que é assegurada por equipas multidisciplinares com uma ação concertada no terreno.

Na opinião da investigadora Lia Fernandes (CINTESIS e Faculdade de Medicina da Universidade do Porto), a prioridade deve estar nos cuidados de saúde primários e cuidados na comunidade.  “Precisamos de respostas de proximidade com equipas que deem apoio no domicílio e estruturas intermédias, como centros de dia e hospitais de dia, para que as pessoas estejam apoiadas. Os lares e as unidades de cuidados continuados devem ser fins de linha”. 

No terreno, Misericórdias como Cantanhede reconhecem as vantagens de reforçar o apoio prestado no domicílio através de uma articulação com os cuidados de saúde primários. “A relação direta com os centros de saúde parece-me ser um ponto de partida porque permite rentabilizar recursos sem se verificar a duplicação de serviços”, referiu o administrador delegado, Alexandre Henriques, em declarações ao VM.

Os números recolhidos pelo Gabinete de Ação Social da UMP, num inquérito realizado no âmbito deste Laboratório de Ideias, falam por si. Das cerca de 171 respostas obtidas, mais de 40% referiu a necessidade de prestar cuidados de saúde (médico, fisioterapia, enfermagem) aos utentes de SAD e de reforçar o apoio a familiares e cuidadores (14%), entre outros serviços, em articulação com as estruturas locais (centro de saúde, hospitais, etc.).

De forma geral, as Misericórdias reconhecem a necessidade de reforçar o apoio prestado, apontando, contudo, obstáculos de ordem financeira na concretização deste modelo. “A saúde é uma mais valia se for integrada no SAD, disso não há dúvidas. A questão prende-se com o financiamento destes serviços. Perceber se são os utentes, os familiares, a Misericórdia ou o Estado a assegurar essa comparticipação”, constata a diretora técnica do lar da Misericórdia de Vila Verde, Fátima Barros, que integrou o grupo de trabalho orientado pela UMP. 

Neste momento, as principais fontes de financiamento para os serviços de saúde no SAD, indicadas pelas instituições inquiridas, são a comparticipação dos utentes (63%), acordos atípicos com a Segurança Social (25,2%) e a própria Misericórdia (26,8%). 

A cultura institucional é outro dos desafios apresentados na implementação deste modelo de cuidados integrados. As equipas de cuidados continuados integrados (ECCI), centros de saúde, ou outros serviços, e as equipas de apoio domiciliário das Misericórdias “trabalham de costas voltadas”. Como constatam os técnicos de Vila Verde, há dificuldades em articular diretamente com o médico de família ou burocracias nos serviços públicos a bloquear o processo.

Apesar dos constrangimentos, o vogal da UMP responsável pela área da saúde, Manuel Caldas de Almeida, está otimista e constata que as Misericórdias estão mobilizadas na concretização deste modelo. “Quando se põem duas equipas a trabalhar em conjunto, sabemos que vai haver resistências locais. Mas os profissionais estão empenhados em ultrapassar esse problema. Ninguém pode prestar cuidados sozinho” (ver entrevista)

Uma centena de técnicos e dirigentes, de 41 Misericórdias, marcou presença no seminário do Laboratório de Ideias sobre “Apoio Domiciliário e Saúde”, no âmbito do projeto de Capacitação da UMP, financiado pelo POISE.

Voz das Misericórdias, Ana Cargaleiro de Freitas