Os museus e espaços similares reabriram no dia 5 de abril. Enquanto estiveram de portas fechadas ao público, a atividade não cessou.

Os museus, monumentos, palácios e espaços similares reabriram no dia 5 de abril, na sequência do plano de desconfinamento progressivo, anunciado a 11 de março pelo Governo. Enquanto estiveram de portas fechadas ao público, a atividade não cessou. A maioria das Misericórdias e outras entidades aproveitaram para inventariar e estudar as coleções, renovar o circuito de exposições e avançar com obras de manutenção dos espaços, sem descurar a ligação aos públicos, para evitar a perda irrecuperável de visitantes.

À semelhança do primeiro confinamento, os técnicos elencaram como prioridades a inventariação, conservação, reestruturação de serviços educativos e programas expositivos, antecipando neste interregno a reabertura gradual e segura dos espaços museológicos.

Longe do olhar do público, as equipas continuaram a zelar pela conservação das peças em exposição ou nas reservas, assegurando atividades de manutenção básica, como limpezas, monitorizações de estado de conservação e controlo de temperatura e humidade.

O silêncio em que mergulharam os monumentos, museus e arquivos não foi sinónimo de inatividade. Pelo contrário. Libertos da gestão do dia-a-dia, alguns responsáveis e técnicos de museologia reconhecem que foi possível dedicar mais tempo a tarefas como a inventariação, estudo e preparação de novas exposições.

Nos bastidores do museu da Misericórdia de Matosinhos, a atenção recaiu sobre o tratamento arquivístico da documentação, apoio aos investigadores e produção de conteúdos para a reabertura. “Como Matosinhos carece de muito tratamento de documentação e produção de conteúdos, focámo-nos nisso, foi muito produtivo, trabalhámos mais do que se tivéssemos o museu aberto”, recorda Rita Pedras, responsável pelo espaço. Ao longo destes meses, foi também possível inventariar todo o espólio têxtil à guarda da instituição, num total de 400 peças entre os séculos XVII e XX. “Foi um trabalho muito moroso”.

Em Coimbra, o diretor do museu admite que se criaram oportunidades de aprendizagem e melhoria interna a partir das restrições impostas. Ao longo dos dois confinamentos, Raul Mendes conta que foram inventariadas mais de 400 peças, recorrendo a um novo modelo de inventário, utilizado pela maioria dos museus nacionais. Em paralelo deram início à criação de dois núcleos permanentes, dedicados a mobiliário dos séculos XVII ao XIX e paramentaria.

Em regime presencial ou teletrabalho, a dinâmica interna adaptou-se à dimensão das equipas e recursos disponíveis, permitindo, no caso de Penafiel, reestruturar o espaço, ao nível do programa museológico e percurso de visita. “Um museu é muito mais abrangente do que o serviço ao público, tivemos oportunidade de investir e reforçar outros serviços”, detalhou a responsável Rita Pedras.

Depois de um período de introspeção, para atualização de inventário e manutenção do edifício, os espaços culturais estão focados em “trazer as pessoas de volta ao museu”. Os planos são cautelosos para não gorar expetativas e dependem “muito da evolução da pandemia”, admite o responsável da Casa-Museu do Crato, António Ferreira, antecipando um retorno gradual do público. “No verão a casa-museu terá parte ativa numa iniciativa do município que abrange todo o concelho, com exposições, workshops e cedência de peças”.

O burburinho dos visitantes regressa gradualmente aos corredores dos museus, mas nalguns pontos do país está dependente da retoma do turismo nacional e internacional. Em Seia, a diretora do museu e centro interpretativo nota que, apesar de se encontrarem num local de excelência, em pleno centro histórico, “as pessoas ainda estão reticentes”. Anseia, como tal, “a retoma com alguma normalidade do funcionamento e a abertura de portas em segurança”.

Adaptar e atrair novos públicos é o objetivo do Museu Tesouro da Misericórdia de Viseu, enquanto não regressam os turistas e grupos educativos. “O nosso museu tinha grande procura de grupos escolares e de público sénior, que tão depressa não devem regressar. Em contraponto, vamos tentar criar dinâmicas para o público local, com divulgação na imprensa, idas à torre da igreja e visitas à exposição temporária para que as pessoas de Viseu venham ao museu”, adiantou Henrique Almeida, diretor do museu, em declarações ao VM.

A aposta na comunicação digital, através de narrativas em torno das peças, visitas virtuais, conversas e cursos online, facilita esta ligação, mas para Manuela Machado, coordenadora do Centro Interpretativo das Memórias da Misericórdia de Braga, “nada substitui o presencial”. Defende, por isso, que se voltem a “impulsionar as visitas aos espaços culturais e fruição do nosso património. Estes centros vivem muito da interação com o público”.

Esta dinâmica de museu vivo, aberto à comunidade, determinou que em São Brás de Alportel o regresso presencial fosse uma inevitabilidade. “Sentimos muita pressão para retomar algumas atividades. Além de sermos um museu tradicional de exposições, somos também um museu social, com cerca de 30 modalidades distintas, desde teatro, música, ginástica, yoga e pintura”, revela o diretor do museu do Traje, Emanuel Sancho.

80

As receitas de bilheteira de museus e monumentos nacionais registaram uma quebra de cerca de 80% em 2020. A informação divulgada pelo Governo, em dezembro de 2020, no relatório sobre a aplicação da declaração do estado de emergência, indica que as visitas aos museus, monumentos e palácios nacionais de 18 de maio, dia de reabertura depois do primeiro estado de emergência, a 24 de novembro, renderam pouco mais de 1,7 milhões de euros, com o Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, a contribuir com quase um terço do total.

75

Seguindo a tendência nacional, o número de visitantes do Centro Interpretativo das Memórias (CIM) da Misericórdia de Braga registou uma quebra de cerca de 75% em 2020, quando comparado com 2019. A diretora do CIM, Manuela Machado, ressalva, contudo, que os meses de verão apresentaram um “resultado bastante positivo, face ao expetável”. Por outro lado, constatam que se verificou maior interação e contacto com o público nas redes sociais. Desde a abertura do CIM, em 2015, foram contabilizados 86 mil visitantes.

Estudo do arquivo vai ser publicado

O estudo do arquivo histórico da Misericórdia de Seia, realizado no decorrer dos confinamentos, vai enriquecer as comemorações dos 450 anos da instituição com a publicação de uma obra. O programa de atividades suspenso nos primeiros meses do ano será, segundo a responsável do museu, retomado em maio. Está igualmente prevista a inauguração de uma exposição sobre os monumentos desaparecidos da vila de Seia, na sequência da reestruturação urbana ao longo dos séculos.

Museu acessível para todos no Algarve

Uma das novidades que vai marcar a reabertura do museu do traje da Misericórdia de Brás de Alportel, no enclave entre a serra e o mar, é a melhoria de acessibilidades físicas e criação de zonas interativas para os visitantes. No âmbito do projeto “Museu para Todos”, financiado pelo Turismo de Portugal, o museu vai dispor de rampas de acesso, salas interativas, informação em língua gestual e braille, uma aplicação informática e um jardim sensorial, com 40 plantas da região.

Conselhos para uma reabertura segura

Para apoiar o funcionamento dos espaços museológicos e culturais, a equipa do Gabinete de Património Cultural da UMP emitiu e partilhou recomendações emanadas pela Direção Geral de Património Cultural e Direção Geral da Saúde, no decorrer último ano. Entre as notas enviadas, destacam-se recomendações de segurança para prevenir furtos, orientações para os locais de culto, recomendações para a reabertura segura de equipamentos culturais e para a realização de espetáculos.

Eventos culturais da UMP serão retomados

Em 2020, devido aos constrangimentos da pandemia, a UMP foi forçada a cancelar dois eventos anuais de âmbito nacional, na área da museologia e património cultural. Segundo o Gabinete do Património Cultural, responsável pela organização dos eventos em colaboração com as Santas Casas locais, as VII Jornadas de Museologia e o XI Dia do Património das Misericórdias, serão retomadas assim que estejam reunidas as condições de segurança necessárias.

Património religioso na rua com a população

Durante a Quaresma, a Misericórdia de Penafiel colocou sete painéis de grandes dimensões nas principais artérias da cidade com representações das bandeiras processionais do século XVII para manter uma relação de proximidade com a comunidade, num ano atípico em que não se realizaram celebrações. O objetivo, segundo a responsável do museu, Rita Pedras, foi “levar as peças ao público durante o período de encerramento”, dada a impossibilidade de realizar a procissão.

Exposições marcam a reabertura do museu

O museu da Misericórdia de Viseu decidiu prolongar a exposição temporária “PARA ALÉM DOS LIMITES - Imagens de uma Aventura”, da pintora Isabel Nunes, no âmbito da reabertura condicionada e progressiva. A exposição de 80 telas agrupa-se em três núcleos que aludem a temas como a religião, navegação, cultura, história e ciência. Segundo o diretor do museu, Henrique Almeida, outra das novidades em curso, a ser anunciada em breve, é a preparação de uma nova exposição com retratos de provedores e benfeitores, dos anos 1950 à atualidade.

Arte para comunicar com o público

O museu da Misericórdia de Coimbra reforçou a comunicação com o público, pela via digital, enquanto esteve impedido de receber visitantes, dando continuidade a um trabalho iniciado antes da pandemia que visa a divulgação das coleções e história da instituição. “As peças foram feitas para comunicar e transmitir uma mensagem. Tentamos enquadrá-las e contar uma história para que as pessoas percebam que as peças estão ao alcance delas e pertencem a todos. É o que se chama de educação não formal pela arte”, justificou o diretor, Raul Mendes.

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Foto da exposição "Alberto Giacometti – Peter Lindbergh. Capturar o Invisível" patente no MMIPO