Manuel de Lemos foi reconduzido na liderança das Misericórdias com uma taxa de votação inédita na história da União, com cerca de 70 por cento das Santas Casas a participar no ato eleitoral. Durante a tomada de posse da nova equipa para o quadriénio 2020-2023, o presidente reeleito afirmou que os recentes aumentos do salário mínimo nacional “são justíssimos”, mas “vão provocar o maior terramoto coletivo do setor social”. Entre as prioridades para o novo mandato destacam-se a sustentabilidade, transparência e rigor na gestão, o reforço da cooperação com entidades públicas, privadas e universidades e o desenvolvimento de um novo modelo de apoio domiciliário. Foi em Fátima, no Centro João Paulo II, a 7 de dezembro.

Por motivos de agenda, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, esteve em Fátima no final da assembleia-geral ordinária. A ministra da Saúde, Marta Temido, não esteve presente, tendo justificado a sua ausência com a preparação do orçamento de Estado.

Apesar das alterações ao programa, ouviram-se os discursos com apelos e repostas para aquele que é o tema mais preocupante da atualidade das Misericórdias: a sustentabilidade, num cenário balizado pelo compromisso de cooperação com o Estado e os aumentos do salário mínimo nacional.

Para Manuel de Lemos, os recentes aumentos do salário mínimo “são justíssimos no plano individual”, mas “vão provocar, seguramente, no plano global, o maior terramoto coletivo do setor social”. Por isso, continuou o presidente reeleito, a única hipótese é, em sede de cooperação, o Estado compensar esses aumentos através das comparticipações pelos serviços prestados pelas Misericórdias.

Num momento de extrema fragilidade de tesouraria, Manuel de Lemos lembrou, durante o seu discurso de tomada de posse, que as Misericórdias se encontram numa encruzilhada. Sem aumentos das comparticipações, as Santas Casas poderão entrar “no mundo sombrio dos salários em atraso ou, pura e simplesmente, fechamos a porta à cooperação e voltamos ao exercício puro e duro da caridade”. Otimista em relação ao futuro da cooperação, o presidente da UMP disse acreditar ser possível “encontrar um ponto de encontro que nos permita a todos continuar a servir os portugueses”.

Mas não é apenas na gestão de tesouraria que o aumento do salário mínimo tem impacto. De acordo com Manuel de Lemos, as Misericórdias e a União têm tido cada vez maior dificuldade em recrutar recursos humanos e isso deve-se aos baixos salários praticados. Além disso, destacou, “não só é necessário pagar aos trabalhadores o que a lei exige, como é igualmente necessário elaborar uma grelha salarial minimamente harmoniosa que privilegie o tempo e a competência desses mesmos trabalhadores”.    

Neste cenário, a “confiança e a presença maciça” de provedores e provedoras no Centro João Paulo II representam “um suplemento de alma e um acréscimo de responsabilidade”, mas também dão nota à “sociedade portuguesa e seus responsáveis da unidade e da representação da UMP” na expressão dos anseios e preocupações dos dirigentes das Misericórdias. Os provedores, disse o presidente da UMP, “estão preocupados com o momento que vivemos, sobretudo no que respeita à sustentabilidade, que é decisiva para podermos continuar a desempenhar, com qualidade, a nossa missão de apoiar os portugueses”.

O discurso (escrito quatro vezes devido às alterações de agenda por parte das ministras) foi proferido durante a tomada de posse, mas encontrou resposta poucas horas antes, nas palavras dirigidas pela ministra Ana Mendes Godinho aos provedores e provedoras que estavam em Fátima.

Para a ministra da tutela, que falava em representação do governo, “as Misericórdias têm sido parceiros fundamentais do Estado na prestação de serviços às populações” e essa parceria é “assumida por todos como fundamental”. Destacando ter consciência dos “desafios críticos”, Ana Mendes Godinho reforçou os “objetivos comuns para os ultrapassar”, assim como a “convicção e o compromisso para aumentar a capacidade de resposta adaptada aos novos problemas e desafios”.

“Aumentar a eficácia e a eficiência da nossa capacidade conjunta de intervenção e promover uma sustentabilidade social, económica e financeira que permita que as entidades de economia social e as Misericórdias tenham capacidade de intervenção eficaz e ágil para dar respostas às necessidades identificadas no terreno” é um compromisso do governo, disse.

Para o efeito, Ana Mendes Godinho elencou diversas medidas, entre elas a criação de equipas técnicas de acompanhamento que permitam “não esta dicotomia entre a fiscalização e quem está a prestar o serviço, mas uma lógica permanente de parceria e objetivos comuns”.

Melhoria dos instrumentos de regulação, criação de respostas “mais céleres” e “cada vez mais inovadoras e abertas que não estejam compartimentadas em velhos modelos”, formação e qualificação de “dirigentes, trabalhadores, utentes e técnicos” e um programa de apoio para contratação de trabalhadores, direcionada apenas ao setor social, foram outras medidas apresentadas.

Sobre o impacto do salário mínimo nacional, Ana Mendes Godinho assumiu que se trata de um desafio, mas deixou o repto. “Olhemos para isso como uma forma de valorizar os trabalhadores” para que eles possam ser “um instrumento de dinamização do setor social”. Valorizar o trabalho é “claramente um desafio para o país”.

Lembrando que Estado e setor social têm “uma missão comum” que passa por “estar sempre ao serviço de todos e criar um país cada vez mais coeso, mais igual, mais justo”, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social concluiu dizendo que para dar resposta aos desafios é “preciso que cada um contribua com o seu papel”.

Ana Mendes Godinho discursou depois do presidente da Mesa da Assembleia Geral. Segundo José Silva Peneda, algumas das dificuldades atuais “resultam da noção por parte dos dirigentes das Santas Casas que, estando a ultrapassar os limites das suas forças para conseguirem dar respostas aos problemas que lhes batem à porta, apodera-se deles um sentimento de incompreensão e de injustiça pela forma como, nessas circunstâncias, são abordados por alguns serviços públicos”.

A recandidatura de Manuel de Lemos surgiu na sequência de um manifesto assinado por todos os Secretariados Regionais das Misericórdias, onde foi reforçada a confiança e empenho no atual presidente “assente na determinação, experiência e espírito de missão”.

No programa eleitoral que propôs às Santas Casas, Manuel de Lemos realçou que a principal preocupação da UMP vai continuar a ser a sustentabilidade das Misericórdias, em termos de comparticipações justas para as diversas respostas sociais disponibilizadas à população. Embora tenha havido uma atualização de 3,5% nas comparticipações, as Misericórdias continuam com problemas para garantir de forma equilibrada e sustentada a sua missão junto da população, bem como para criar condições que permitam a melhoria das condições de trabalho e a formação contínua dos seus colaboradores.

No mesmo dia, os dirigentes das Misericórdias apreciaram e aprovaram por unanimidade o plano de atividades e orçamento da UMP para 2020 e assistiram à tomada de posse da nova equipa, numa cerimónia que contou com o bispo de Santarém, D. José Traquina, o presidente honorário da UMP, Vítor Melícias, deputados da Assembleia da República, representantes do município de Ourém e do setor social, entre outros convidados.

Voz das Misericórdias, Bethania Pagin

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